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06/09/2019
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Raiva no processo do luto | Nomoblidis | Povenção de Suicídio

A raiva no meu processo do luto

Dois anos e cinco meses se passaram depois da morte da Marina, li e ouvi muitos profissionais falarem do emaranhado de sentimentos no luto, alguns ficaram nítidos, mas a raiva eu garantia que não sentia, pois entendia que a raiva seria pela Marina, batia o pé que não havia esse sentimento.

Realmente pela Marina não, mas por todas as pessoas que eu julgava não ter ajudado como deveriam e esse sentimento esteve presente desde a notícia da morte, só que eu não o percebia desta forma.

No dia da morte, eu e Joseval, ao cuidarmos de todas as burocracias existentes, e por um erro cometido pelo médico ao preencher o formulário que atestava a morte, tivemos que  voltar ao hospital, lugar onde juramos nunca mais pôr os pés, para pedir que fizessem um novo documento. 

Era troca de plantão e nos fizeram esperar por algumas horas que pareciam não passar, depois de muita demora, fomos direcionados até o diretor do hospital para que ele nos explicasse o motivo de não assinar o formulário.

Primeiro nos disse que lamentava pela Marina e que não conseguia imaginar a dor que estávamos sentindo, que os médicos fizeram tudo que era possível para salvá-la que ele acompanhou o caso, mas que não podia assinar pois como havia sido uma tentativa de suicídio e que ela havia sido transferida de um outro serviço onde ela havia sido negligenciada, não poderia e não permitiria que nenhum médico, além do responsável pela UTI assinasse o laudo e como a médica plantonista que estava na hora da morte já havia ido embora, o corpo deveria seguir para o IML. Pediu desculpas, falou da reestruturação da qual o hospital estava passando.

Não sei de onde consegui forças, com o coração sangrando e com a voz embargada, comecei a falar e me lembro exatamente de cada palavra. 

Falei que a minha filha havia morrido pois essa é a sina de todo ser vivo, nascer e um dia morrer, que minha filha tinha uma doença, que infelizmente ela não teve o tempo necessário e a paciência para que a doença fosse controlada.  Que médicos não são pessoas que curam doenças, médicos são pessoas que aliviam o sofrimento de outras pessoas, de humanos, médicos precisam gostar de gente.

E que não vi naquele hospital, humanidade, e já que ele havia falado que estavam passando por uma reestruturação, que ao contratar novos funcionários para cuidar de pessoas, que procurasse quem gostasse de gente. Pensasse menos em dinheiro e mais nas pessoas.

Contei os absurdos que aconteceram durante os 18 dias que minha filha permaneceu naquele lugar, a desumanidade, ao ponto de pintarem uma UTI e deixarem minha filha sozinha, ao lado de paredes descascadas e lonas pretas, uma paciente com pneumonia em um local insalubre, deixando claro o descaso com que são tratadas pessoas que tentam suicídio e quando questionei, fui mal tratada pelo enfermeiro.  

Disse que só vi humanidade na faxineira que me contava como a Marina reagia a certos estímulos na hora da fisioterapia e no segurança que fazia um pouco de graça para tentar alegrar as pessoas na hora da visita, pois sabia da barra que era estar naquele lugar.

Hoje percebo claramente que foi a raiva que me fez falar daquela forma, pois eu ali na frente daquele homem era uma mãe que tinha acabado de perder a filha e acreditava nos vários erros que ocorreram e não era só de um corpo que estávamos falando e sim de uma vida, que tinha uma família, uma porção de pessoas que a amava e que ao dar entrada naquele lugar, havia depositado nas mãos dos médicos toda minha esperança, toda a minha riqueza e estava saindo de lá sem elas e não saberia como seria viver sem.

A raiva que eu sentia era imensa, juntamente com a dor da perda, foi um entorpecimento que me fez fazer tudo que se seguiu depois dali, BO na delegacia, corpo seguir para o IML, velório, enterro, essas coisas que uma mãe nunca quer ter que fazer por um filho.

Com o tempo fui reconhecendo dentro do processo do luto a raiva que me negava a admitir que sentia, nos primeiros meses eu estava a procura de culpados e direcionei a culpa e consequente a raiva para a equipe médica devido a tudo que ocorreu desde a entrada dela no Pronto Socorro até a sua morte, estava clara para os outros, menos para mim.

E foi a raiva me fez começar a escrever, pois ao colocar no papel todos os meus sentimentos de desamparo e solidão, me sentia aliviada. Meus primeiros textos falam justamente sobre os maus tratos no hospital e a falta de empatia, da desinformação e do preconceito com os portadores de transtornos mentais, principalmente a depressão que nem é vista como doença muitas vezes pelo próprios profissionais da área da saúde, o que me deixava abismada.

Aprendi com o luto que apesar da raiva ser um sentimento legítimo, que me impulsionou a fazer várias coisas, se eu deixasse que o sentimento me dominasse eu iria me tornar uma pessoa ressentida, amargurada e cheia de rancor e que eu tinhas duas opções a escolher, aceitar o que eu não poderia mudar e seguir um caminho buscando a paz interior e a leveza ou simplesmente me trancar e deixar que a raiva se tornasse ódio e passaria o resto de meus dias, de mal com a vida, culpando tudo e todos.

Escolhi ser leve, escolhi acolher, escolhi falar sobre o Luto por Suicídio, mostrar como é a vida de quem fica e que por mais dolorido, por pior que seja ter que acordar todos os dias e lembrar que terei mais um dia e que mesmo com um buraco no peito para poder sobreviver preciso de forças e que para seguir adiante, este caminho se tornou o menos árduo, e que ao compartilhar minhas dores e acolher quem também sofre, estou conseguindo seguir adiante e que a raiva, a amargura e o rancor, me ajudaram no começo da caminhada mas que poderia também ter me levado para um abismo, talvez, sem volta.

15 Comments

  1. Marcia disse:

    Ah minha amiga…
    A minha raiva foi inclusive com Deus…
    Hoje faz dez meses que a Isa se foi…e eu me sinto como que anestesiada… vivo no automático quase todo tempo…

    • Flávia disse:

      Márcia, eu tive raiva de parentes que não me ajudaram a lidar com o meu filho que se foi, por Suícidio, há 2 anos.
      Mas tento buscar o autoconhecimento e pessoas que possam me ajudar a carregar a dor!
      😢

  2. Renata disse:

    A raiva é um sentimento natural não a nada de errado de sentir o problema é o que fazemos com ela ….. a raiva nos impusiona a fazer coisas boas. …

  3. Rosane Freitas disse:

    meu filho Diego partiu com 25 anos incompletos em 21\01\2014 por enforcamento , estava em tratamento depressão severa após final de um relacionamento de 9 anos…foram 3 tentativas ( 1 x medicamentos outra por envenenamento que o levou pra UTI , e a terceira vez a corda e nada pode fazer …qdo o encontramos já era tarde d+ …por mais que eu e os outros irmãos dele o cercasse de cuidados e vigilância , enfim aconteceu o suicidio…posso te dizer que jamais seremos iguais …nossa familia se quebrou e vivemos cada um com sua maneira para tentar superar o insuperavél…a dor e a ausência dele nos acompanha a cada momento …é muito triste 1 jovem cheio de vida partir assim deixando sonhos….planos… e uma dor insupaerável nas pessoas que o amavam e conviviam com ele…meu coração de mãe grita….sangra…chora…minha alma terrivelmente triste espera por um reencontro na eternidade ….

    • Terezinha C. G. Maximo disse:

      Rosana, sinto muito por sua perda.
      O tempo para nos que perdemos um filho não parece ajudar, pelo contrário, dá a impressão que com o tempo a saudade vai cada dia nos sufocando mais.
      E temos que aprender a viver um dia de cada vez, sofrendo com a saudade mas na esperança de um reencontro.
      Um grande e forte abraço.

    • Anônimo disse:

      Querida minha alma também queima te entendo muito.

  4. RUBENS ROMAGNOLLI disse:

    Sigam a vida e, se possível, com intensa alegria. A morte é a única coisa certa em nossa existência e bom seria que houvesse uma sequência lógica em que jamais enterrássemos um filho. Mas não é, e o nosso sofrimento é também o nosso inferno. O auto julgamento é o mais doloroso dos processos, porque não podemos reagir contra nós mesmos. Por consolo, saibam que uma mãe nunca negligencia um filho, então vocês não falharam em momento algum, apenas sofrem por algo cometido contra vocês próprias e nunca provocado por vocês.

    • Adriana disse:

      Rubens, concordo plenamente com você… uma mãe jamais negligencia um filho…
      Por isso é que devemos aprender juntos, um ensinando ao outro, para que possamos, não apenas, a lhe dar com nossas perdas, mas para que também possamos identificar e ajudar outras vidas.
      Um grande abraço a essas mães.

  5. Edy disse:

    Pessoal, sinto e passo por tudo isso… Parece que as pessoas nos olham confirmando nosso auto julgamento e culpa, além de julgar a minha filha que se suicidou há 4 meses. Elas não consideram quanto nosso amor de mãe é enorme… eu tenho tentado continuar a vida, com ajuda, mas sinto que as pessoas querem que a gente morra junto, julgam, dão a entender que faltou base familiar. No caso da minha filha pode até ter faltado, pois o pai era ausente e com certeza também tive minhas falhas, pois não encherguei como deveria a gravidade da situação, achei que ela estava superando a depressão. Ela era puro amor, vivia o bem intensamente, defendia os oprimidos, moradores de rua, marginalizados etc. É difícil demais pensar que ela não liga e não virá mais, que não nos abraçaremos… Às vezes acho que tudo que as pessoas falam é para se referir a morte e a ela. É horrível isso.

    • Terezinha C. G. Maximo disse:

      Edy, sinto muito por sus perda.
      Eu costumo dizer que com a morte da minha filha me surpreendi com várias pessoas e as piores percepções que tive foram daqueles que enchem a boca para falar de Deus e julgam o que desconhecem.
      Mães não são onipresentes e onipotentes, não leem mentes, não tem visão além do alcance, como muitos pensam. Somos humanos e não temos super poderes. A decisão de vida e morte não estava em nossas mãos, pois com certeza se tivesse, elas estariam aqui, pois sei que você, assim como eu, faria tudo o fosse possível para que não tivesse acontecido o que aconteceu.
      Eu, tenho a plena certeza de que fui uma boa mãe, amei e fui amada e isso me dá forças todos os dias para continuar, hoje está completando 2 anos e 7 meses da morte da Marina, tem dias que é tudo muito difícil, mas ainda tenho fé e é essa fé que me faz prosseguir, com julgamentos e tudo, só Deus sabe o que passamos, só ele sabe o que verdadeiramente aconteceu e por isso fico tranquila.
      Um grande e forte abraço para você.

  6. Geraldo disse:

    Que Deus possa, na sua infinita misericórdia, consolar a todos que passaram por essa experiência horrível. Também perdi uma filha em março de 2019 e até hoje eu me pergunto por que ela nos deixou. Por mais que a pessoas digam, sei que fui negligente com minha filha, mais a mãe e os irmãos dela era muuutio próximos a ela e eram super unidos, então por que ela tomou essa decisão? Me desculpe, mas pelos relatos vocês viveram imensamente com seus filhos e eu um pai que não cuidou como deveria, não deu a atenção necessária, não foi pai capaz de salvar a filha, enfim. Tinhamos uma relação muito, mas muito próxima quando ela ainda era criança e após atingir a maior idade trilhou seus próprios caminhos mesmo eu não concordando. O que me resta é uma imensa dor e a responsabilidade de criar meus dois outros filhos porque eles já sofreram demais nessa vida. Fico pensando que se não fossem eles eu teria q ter a coragem e a dignidade que ela teve. Um grande abraço a todos e que Deus nos dê força para seguirmos em frente.

  7. JC disse:

    Oi, não sei se posso escrever aqui mais preciso colocar esse sentimento pra fora. Hoje faz 24 dias que meu namorado tirou a vida, e sei que fui o culpado porque o traí. Eu não conseguia esconder meu erro então confessei a ele, e dessa traição surgiu uma gravidez. Fui sincero com ele porque não aguentava a culpa e pensava na minha cabeça que tudo ia se resolver, engano meu. No outro dia recebo um email dele pedindo desculpas que não era forte o suficiente e que ” por amor viveu e por amor morreu”, essa frase foi como uma faca no meu peito, corri até onde ele morava e encontrei a cena mais horrível de roda minha vida, o corpo da pessoa que eu amava pendurada porque tinha o recepcionado. Todo dia essa culpa me consome, me mata aos poucos. Obrigado pela atenção.

    • Mary disse:

      Eu imagino a sua dor, perdi minha mãe a poucos meses e é como se fosse ontem, carrego culpa pq sei que tive participação na morte dela. Estava presa em um relacionamento destrutivo onde eu priorizava está pessoa acima de TD, e não dava atenção a ela, tão pouco a priorizava e cuidava dela como deveria, estava presa somente no meu relacionamento. Minha mãe se foi e sei que tive participação nisso. A dor é insuportável, e perder uma mãe é mto pior que perder uma namorado. Agora eu acredito que ninguém pode ter sobre sua responsabilidade a vida de outra pessoa, é mto cruel isso. Tenha em mente que ele foi pq quis tomar está decisão, não é justo vc se condenar, se condene como eu pela traição, no meu caso por não ter dado amor, mas não pela morte. E a nossa recompensa é viver dia após dia com a culpa, pq está não vai embora e nem seria justo que fosse. Tudo de melhor para vc, aquele que arrepende e deixa merece perdão.

  8. Mary disse:

    Interessante o seu relato qdo fala da raiva, em mim foi a fuga, foi fingir estar bem, fugi, mais meu luto está aqui, acredito que foi pior e hoje me culpo também por isso. Mas foi no momento a forma que consegui. Faz oito meses que perdi minha mãe.

  9. Renata disse:

    Mary e JC : Não se culpem. O suicídio é um ato multifatorial e se a pessoa foi capaz de realizar esse ato, é porque era doente , comprometido psicologicamente. É natural do ser humano ter que sofrer desilusões, ser traído, perder um brinquedo para o coleguinha, perder o emprego, perder a namorada, e faz parte do processo de amadurecimento se levantar e seguir em frente, isso faz parte da vida. Se a pessoa não consegue ela está doente e precisa de ajuda. Alguns casos culminam em suicídio. Meu pai se suicidou faz quase 1 ano, era alcoólatra, e tinha baixa tolerância a qualquer desilusão, Não podemos nos culpar de nada gente. Seres humanos tem de saber se relacionar. A vida é difícil pra todo mundo. Tem de saber perder também. Mas essas pessoas são comprometidas psiquicamente. Não as culpem e nem se sintam culpadas.

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