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O livro do professor - Posvenção do Suicídio

O livro do professor

A única certeza que tenho é a de que nasci e que morrerei, só não sei quando e nem como, e que neste intervalo de tempo entre o nascimento e a morte é a vida e que não há um manual de como vivê-la e que durante este período, estou exposta a tudo, inclusive a passar por situações que podem me desafiar e a me fazer repensar como estou vivendo.

Meu maior desafio até aqui, foi ter que enfrentar a morte da minha filha para conseguir seguir adiante da melhor forma possível e para isso busquei ajuda para poder reaprender a viver.

Busquei em livros, escutei pessoas e com o tempo me dei conta de que eu tive próximo de mim o maior exemplo de como conviver com perdas.

Minha avó Irene foi um exemplo de resiliência, viveu 86 anos e além de ter enterrado seus pais, sogros, irmãos e irmãs, ficou viúva 2 vezes, enterrou 2 filhas adultas e encarava esses fatos como vontade de Deus. 

Tinha uma fé inabalável, emanava amor, carinho e cuidado para com todos, tinha sempre uma palavra de acolhimento qualquer que fosse o evento. 

Ela era professora e foi na casa dela, quando eu devia ter uns 10 anos, mexendo em uma pilha de livros, que descobri que professores tinham “O Livro do Professor”,   livros com todas as respostas para as perguntas que eles faziam para os alunos, foi um misto de encantamento e decepção.

Encantamento por imaginar que havia um livro com respostas para tudo, ficava imaginando ter um livro daqueles, com todas as respostas, inclusive das coisas que eu ainda nem tinha aprendido, naquela época meu mundo era do tamanho de um grão de mostarda, as maiores dúvidas eram saber colocar as letras nos lugares certos, que a letra M vinha antes do B e do P, saber onde usar o Ç e SS, decorar a tabuada para poder armar e efetuar contas simples, ler um texto do livro e entender que para algumas palavras tinham vários significados. 

Decepção pois imaginava professores como seres extraordinários, fora de série que sabiam de tudo e que dividiam esse saber, tinha paciência em ensinar e não por terem um livro com todas as respostas para as perguntas que elas me fazia, sabiam por já terem aprendido, por terem vivido e não por saber onde as respostas estavam. No fundo era a mesma coisa, mas não entendia. 

Percebi que no luto pela morte de minha filha, voltei a ser aquela criança de 10 anos mexendo na pilha de livros em busca de um livro do professor para ter as respostas de perguntas que me inquietavam sobre como viver depois de sua morte.

Entendi que passar por um processo de luto deveria ser algo esperado, luto não é doença, mas aprender a lidar com a perda de alguém muito amado, exige muito e se não tiver a atenção que esse processo necessita pode sim acabar tendo consequências desastrosas.

Existem muitos livros sobre luto, escritos por pessoas comuns, baseados em experiências de vida, outros em estudos, pesquisas, escritos por mestres e doutores, com classificações, mapeamentos, com suposições, sugestões, dicas, orientações e teorias.

Livros e mais livros, mas como cada ser é único, muitos vão esclarecer algumas dúvidas, mas nem sempre as respostas vão valer para todos e foi então que descobri que eu devo responder a algumas perguntas do meu jeito e que não há certo ou errado na vivência do luto.

Minha avó Irene enfrentou todos os seus lutos com benevolência, para ela, “Deus lhe dava o frio conforme o cobertor” e por isso não contestava e com a sua sabedoria adquirida em seus longos anos, soube como ninguém dosar o amargor que a vida lhe impunha com a doçura que ela insistia em ter. Procurou equilíbrio, não sendo uma pessoa que colocava na conta dos outros as escolhas que ela fez ao longo dos anos. 

Soube filtrar o que era  bom e o que era ruim para ela poder carregar em sua bagagem de vida, achava que viver a vida da forma que viveu era o certo e que por ser temente a Deus, sua recompensa viria além túmulo e fez da sua vida o que ela acreditava ser melhor para ela e para os seus e sempre foi muito querida e um exemplo para muitos.

Acredito que ela escreveu o seu próprio  “Livro do professor”, deu respostas às perguntas que a vida lhe fez e que ela achava que eram certas, algumas respostas não servem para mim mas aprendi a não ser amarga e culpar a tudo e a todos e que coisas boas acontecem, assim como ruins também e que isso é a vida e que o mundo não me deve nada, por isso digo que ela é para mim um exemplo de saber lidar com as perdas.  

Entendi que a qualquer momento da vida a pergunta sobre como viver depois que se perde alguém que se ama será feita por alguém em algum lugar e que algumas pessoas vão em busca do livro do professor para saber a resposta, outras não vão precisar disso, apenas viverão da forma como sempre viveram, com sua fé, mas algumas terão dificuldades de entender mesmo com várias dúvidas respondidas e poderão ficar presas ao processo.

Eu, neste período todo que reaprendo a viver sem minha filha, entendi que no livro do professor não tem as respostas para as perguntas mais difíceis e complexas, pois essas quem deve responder sou eu, com as minhas experiências, com a minha vivência e que serve para mim e mais ninguém, pois cada um deve escrever o seu próprio Livro do Professor.

3 Comments

  1. Vanuce Bento dos Santos disse:

    Querida Terezinha
    É sempre maravilhoso ler suas linhas,dona Irene,ser de muita luz e equilíbrio
    Imenso abraço.

  2. Chris disse:

    Vamos nas longas conversas com nós mesmas, nas quais nos questionamos muito, encontrando algumas respostas, as vezes encontramos mais de uma possibilidade de resposta a uma questão, e ficamos divididas pois cada uma responde uma parte mas nenhuma responde integralmente nossa pergunta. Então muitos dos nossos por quês ficam sem resposta satisfatória. Mas com paciência e resiliência vamos levando a vida e aos poucos algumas respostas vão surgindo. Além dos livros, dos filmes, dos especialistas, dos nossos parentes e amigos que de uma forma ou outra nos auxiliam a obter respostas , temos Deus e nosso anjo guardião estão sempre nos oferecendo esclarecimentos em forma de pensamentos, sonhos ou ideias . Sua tia confiava na misericórdia de Deus. Eu também e acredito que um dia teremos as nossas perguntas respondidas, todas elas, e me acalenta o coração saber que enquanto este dia não chega podemos contar com a absoluta misericórdia divina, que nos conforta, e nos dá forças. Tem uma música que diz “A vida tem horas difíceis pra gente passar
    Pedaços quase impossíveis pra se entender. É uma grande verdade… Mas vamos aprendendo e reaprendendo a viver, a sobreviver, a superar, a seguir em frente mesmo sem ter superado ainda. Viver sem a presença de um ser tão amado, tão querido e que nos faz tanta falta não é fácil, parece impossível e é muito doloroso. Mas o tempo vai passando e apesar do vazio que esta ausência nos deixou, a vida segue, e pouco a pouco vamos nos resignando, nos reinventando, embora saibamos que inteiros nunca mais… Apesar disto a vida continua e nós também.

  3. Chris disse:

    Esqueci de dizer e preciso fazê-lo. Terezinha, você é um ser muito evoluído e iluminado. Você tem o dom da palavra, se expressa clara e lindamente. Obrigada.

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