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O luto, vulnerabilidade e a fé | Nomoblis posvenção do suicídio
O luto, vulnerabilidade e a fé
20/03/2022
No luto, você sabe que não é o mesmo que era - Posvenção do Suicídio
No luto, você sabe que não é o mesmo que era.
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Começar, recomeçar ou continuar?

Em praticamente todos os meus relatos sobre a morte da minha filha, falei e escrevi  sobre como foi importante conversar com outras pessoas que passaram pelo mesmo, para tentar compreender como elas conseguiram continuar a viver. 

Até perceber que continuar não era bem a palavra, não havia como continuar com algo que não existia mais, além da morte da minha filha, morreu também uma vida construída em torno dela, o meu papel desempenhado como mãe, os planos de um possível futuro, o mundo presumido descrito na psicologia.   

E quando esta nova realidade foi ficando cada vez mais nítida, doía muito saber que nunca mais minha vida voltaria a ser como era antes e acumulada com a saudade e com todos os sentimentos que uma morte destas traz, só foi fazendo o buraco no peito aumentar ainda mais, por isso a sensação de que a dor e o sofrimento ficaram piores com o passar dos dias. 

Achava que recomeçar seria a palavra certa, mas recomeçar significa começar de novo e também é sinônimo de continuar, então lembrava que não tinha mais a mesma vida,  não havia como voltar ao ponto de onde ela ficou parada e começar de novo.

Mas eu sempre dizia que estava reaprendendo a viver, reconstruindo minha vida com os cacos da vida anterior, colando o que dava para colar. 

Este jogo de palavras que usava e nem entendia por qual motivo e o ato de escrever foi e é, uma forma de colocar minhas ideias no lugar, buscar entender o que sinto, os textos me fazem refletir sobre meus sentimentos e consequentemente sobre minha ações. 

E a palavra recomeçar estava em vários lugares, mas eu me recusava a usar, tudo bem em reconstruir, reaprender,  em reestruturar, mas recomeçar soava estranho pois para mim,  não tinha mais como recomeçar uma vida, eu teria que partir do zero, afinal o luto é uma adaptação, aprender a viver uma vida sem a pessoa que se foi. 

Uma confusão, uma sensação de não entender mais as palavras, de que elas não faziam sentido e que não cabiam no contexto atual da minha vida. 

Em março de 2019, a querida Elis Conejo, psicóloga do colaboradora do Instituto Vita Alere, me presenteou com um livro do poeta Bráulio Bessa, “Recomece”, ela fez a seguinte dedicatória:

 “Que este livro tão sensível possa inspirar reflexões e contribuir com o seu processo de elaboração do luto”. 

O livro contém a poesia Recomece, ilustrações de Elano Passos e um convite em cada frase para você construir seu próprio poema. 

Na apresentação, Bráulio fala de sua crença no poder de transformação e cura através da palavra e o convite para escrever sobre o que eu gostaria de mudar na minha vida, escrevi: 

“Para mim recomeçar é  diferente de continuar, continuar pressupõe prosseguir o que se iniciou e recomeçar, fazer de novo, de forma diferente e isso muitas pessoas não gostam…”

Só que não são as pessoas, sou eu que não gosto de recomeçar, pois na minha cabeça confusa pelo luto e pelas minhas bagagens da vida, fazer de novo é fazer algo que não ficou bem feito da primeira vez, a palavra recomeçar me remetia a refazer.

O prefixo RE, para mim é algo contraditório, e ele tem 3 funções, a repetição, o reforço e o retrocesso e eu me apegava demais na função de repetir algo que não ficou bom e de retrocesso, que na minha vivência é algo negativo. 

As palavras reconstruir, reaprender, continuar eram as usadas para mostrar minha trajetória e uma frase postada no facebook há 8 anos, que dizia: “permita-se recomeçar” foi que me fez olhar para todos estes singelos sinais do universo e perceber como a vida é feita de recomeços e que o luto pela morte da minha filha nunca foi um recomeço e nem uma continuação e sim o início da fase mais dura e difícil que enfrento. 

A continuação de uma vida é no sentido biológico da palavra, ter vida, eu vivo, respiro, mas não continuo com a mesma vida, mudou tudo e o recomeço está na forma que eu tento escrever a minha história, pois ela começou de um jeito e segue um rumo que nunca imaginei.

E foi lendo a frase do psicólogo americano que é considerado o pai da suicidologia Edwin Shneidman que percebi ela faz todo o sentido e é assim que estou conseguindo até agora entender o meu luto:  

“A morte de uma pessoa não é somente um fim: é também um começo para os sobreviventes.”

Pode parecer óbvio para quem está de fora, porém é muito difícil para quem passa por essa mudança brusca, não há preparo para a perda de quem se ama e se o luto é, começar, recomeçar ou continuar, cada um vai responder a sua maneira. 

2 Comments

  1. Augusto disse:

    No momento, após uma perda dolorosa, estou justamente buscando um caminho. O problema é que para seguir um caminho necessito ‘ler’ as instrucoes de ‘placas’ que me dao conta de uma dislexia até então desconhecida.
    Seu texto ja me ajudou a esfregar os olhos e tentar ler de novo.

    Obrigado

  2. Edivania Keila costa disse:

    Há cinco meses me deparei com meu marido morto em casa ao chegar do trabalho…minha vida se desmoronou….todos os meus sonhos caíram…..fui vencida por essa doença chamada depressão….que muitos não entendem o tanto ser a destruição das famílias
    Hj estou totalmente deprimida….como seguir sem meu amor…..a saudade….a falta….a solidão….
    A única coisa que sinto é vontade de morrer …preciso de ajuda

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